sábado, 8 de março de 2014

O protagonismo da mulher na agroindústria familiar

Por Fénelon do Nascimento Neto, pesquisador da Embrapa Agroindústria de Alimentos, Rio de Janeiro – RJ. 

Quem não se lembra de uma visita na roça, com direito a jogar conversa fora e um convite para um café ou um almoço? E na hora da saída, além de ganhar algumas plantas, fazia parte da educação aceitar um agradinho da Dona Maria, um docinho de leite, uma goiabada, um doce em calda, um doce em massa ou um cristalizado. Hum!!! Delícias que só nós da cidade sabíamos valorizar, pois para eles lá da roça tudo aquilo significava o cotidiano da subsistência, da sustentabilidade da economia, do carinho e do amor, ingredientes importantes das receitas artesanais que ficaram como registro da nossa infância por este interior do Brasil.

Dona Maria era caprichosa e sua cozinha era muito limpa. Equipamentos e utensílios brilhavam e quando não estavam em uso encontravam-se sempre protegidos. Suas receitas vindas da vovó eram segredos facilmente desvendáveis devido ao espírito solidário da guardiã. Esta era a tradição: receitas sempre pertenciam às vovós e eram repassadas por gerações aos seus descendentes.

As mulheres produtoras nos anos pós 1950, reclusas em suas cozinhas, com suas ideias e receitas, passaram a receber a visita de outras mulheres: as extensionistas, as educadoras familiares, as assistentes sociais ou as economistas domésticas; pioneiras nesta transformação no campo e portadoras de novas ideias e procedimentos.

Estas profissionais começaram a fazer um trabalho com a família para ampliar a visão da produção além da receita. A arte de cozinhar foi agregada com novos conceitos, que envolviam a promoção da imagem do produto. Embalagens são aplicadas aos produtos e decoradas com o trabalho caprichoso das mulheres rurais.

Novas receitas e cuidados voltados à conservação dos alimentos, para ampliar a vida de prateleira e chegar mais longe, foram inseridas no modo de produzir. As instalações do ambiente de produção ultrapassaram os limites da cozinha e foram construídos os puxadinhos, anexos das cozinhas e das moradias. Tudo evoluiu a partir de então, a atividade de subsistência centrada na família e com o toque artesanal passa por transformações. Edificações são erguidas para fins próprios da produção como negócio.

Na década de 1990, surgem as legislações higiênico-sanitárias ligadas à segurança no processamento dos alimentos. A atividade individual se organiza. Esposas e maridos se unem desta vez para mais uma atividade econômica: a atividade agroindustrial.

Em muitas propriedades a iniciativa transforma-se em atividade econômica principal. Várias Marias no Brasil se associam para produzir e transformar a produção em atividade agregadora de renda e emprego para suas famílias. Este processo evolutivo percebido pelo governo e por instituições como a Embrapa – Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária exige a entrada de novos atores com novas formações no contexto de produção. Novos profissionais das ciências dos alimentos passam a compor este contingente de mulheres. Entre eles, uma equipe da Embrapa Agroindústria de Alimentos dedicada à popularização das boas práticas de fabricação (BPF).

Estes novos agentes de desenvolvimento nos atuais tempos vinculam-se à educação e envolvem-se na formação dos futuros profissionais do campo, permeiam a fiscalização e vigilância sanitária de municípios, estados e federação, coordenam programas de apoio ao desenvolvimento da agroindústria familiar ou favorecem o direcionamento de políticas públicas voltadas ao desenvolvimento da nova agroindústria familiar estabelecida e a se estabelecer.

O negócio chamado agroindústria familiar cada vez mais internaliza em seu vocabulário termos como: processamento e segmentação, recepção, seleção, lavagem, desinfecção, gabinete sanitário, processamento, embalagem, congelamento e expedição, resíduos e barreiras para pragas, entre outros.

A atividade exige cada vez mais procedimentos de segurança e acima de tudo a abnegação destas dedicadas Marias e suas equipes de mulheres empreendedoras e técnicas, que poderão garantir as nossas mesas produtos cada vez mais saudáveis e de melhor qualidade. Não dá para falar em agroindústria familiar, no atual contexto rural, sem levar em consideração o importante papel da mulher no processo evolutivo da atividade.

Com este artigo o Blog Miracema.RJ homenageia as mulheres por este dia 8 de março - Dia Internacional da Mulher

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