Thaís Antonio
Enviada especial da EBC
Agência Brasil
Cachoeira (BA) - Desde que os colonizadores portugueses chegaram ao
Brasil, há mais de 500 anos, eles exploraram, inicialmente, a mão de
obra indígena. Mas o contato com os homens brancos foi péssimo para a
saúde dos indíos. Além disso, os nativos conheciam muito bem o
território e fugiam com facilidade.
Mas as regras duras da chibata não foram aceitas sem luta. Os negros
escravizados resistiram da forma que puderam. “Falar das lutas negras é
falar disso, dos enfrentamentos, dos embates do outro lado do
Atlântico, na travessia, do lado de cá do Atlântico. Eu costumo pensar
na resistência de uma forma muito ampla”, destaca o professor Nelson
Inocêncio, do Núcleo de Estudos Afro-Brasileiros da Universidade de
Brasília.
Para ele, o termo que define a retirada dos negros do Continente
Africano é sequestro. “Este sequestro realmente foi algo absurdo,
inominável. O Brasil foi o país que mais importou população africana.
Dentro daquele universo de extrema violência existiam articulações
coletivas para, de alguma forma, tentar minar o sistema”, ressaltou
Os locais de refúgio começaram a se formar logo após a chegada dos
primeiros navios negreiros ao Brasil. Nasciam, assim, os chamados
quilombos. O mais famoso deles, o Quilombo dos Palmares, em Alagoas,
data do fim do século XVI. Isso quer dizer que pouco depois do início da
escravidão, os primeiros negros já começaram a fugir.
A herança de quem fugiu da escravidão ainda é viva entre os
quilombolas. Sirilo Rosa, presidente da Associação Quilombo Kalunga,
comunidade no interior de Goiás, conta um pouco da história que já
escutou. “Eu ouvia nossos antepassados falarem que tinha um lugar
chamado quilombo mas que eles não sabiam onde era. [Diziam] que esse
lugar chamado de quilombo era onde o pessoal que foi escravo fugia e ia
pra lá”, lembra. “Era um lugar isolado e que não tinha nem estrada pra
chegar. Eles saíam das casinhas deles, mas não deixavam trilha. Saíam de
um lado e chegavam por outro".
A jovem quilombola Edmeia Batista Costa, da comunidade Kaonge, em
Cachoeira, na Bahia, também conhece a história de quem veio antes. “A
gente sabe que os antepassados lutaram muito. Muitos apanharam no
chicote. Agora a gente não tem mais isso. Graças a Deus, a escravidão já
acabou e eles passaram para gente o trabalho e a luta deles para a
gente continuar”, conta.
O Brasil têm mais de duas mil e quatrocentas comunidades quilombolas
certificadas pela Fundação Cultural Palmares. Elas estão espalhadas em
24 estados e se organizam de forma diferente. A maioria vive da
agricultura de subsistência. Ou seja, eles produzem na roça praticamente
tudo o que precisam. É o caso de dona Leotéria, lavradora Kalunga. Ela
planta mandioca, arroz, milho, cana, feijão de corda, além de frutas,
hortaliças e ervas medicinais.
De acordo com a Fundação Cultural Palmares, apenas os estados do
Acre e de Roraima e o Distrito Federal não contam com esses
remanescentes. Mais de 200 processos de certificação ainda estão sendo
analisados e mais de 500 comunidades foram identificadas pela fundação
como quilombolas, mas não solicitaram a Certidão de Autodefinição, já
que o primeiro passo para ser quilombola, é se reconhecer como tal.
É o famoso sentimento de identidade, como explica Juvani Jovelino,
Líder Espiritual da Comunidade Kaonge, na Bahia. “Ser quilombola é você
saber [a origem] os 50% do seu sangue. Não é só negro que é quilombola,
porque existe branco também que é quilombola porque tem 50% do sangue
que ele não procurou saber de onde vem.”
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