A nova classe média
VIVIANE MEDEIROS CHAIADados do IBGE atestam o ingresso de 30 milhões de brasileiros na classe C, a chamada nova classe média, no período de 2003 a 2008. São pessoas que saíram da classe D a partir de um ganho real (acima da inflação) de renda do trabalho de 7,3% no período.
A nova classe média brasileira é composta por 52% da população economicamente ativa. São 92,8 milhões de pessoas, que compõem o contingente de trabalhadores com salário mensal variável entre R$ 1.115 e R$ 4.807. Ali se concentram 46% da renda nacional.
Esses 30 milhões de cidadãos recém-chegados à classe média (um terço do total) passaram a ter um novo padrão de vida, mensurável pelo acesso a novos produtos, serviços e bens imobiliários. Eles se instalaram no meio da pirâmide social em consequência da política de estabilização econômica (Plano Real) e da ampliação de políticas de inclusão social no governo Lula.
Uma alteração dessa grandeza no perfil socioeconômico do país implica, numa reavaliação do comportamento político da sociedade. Isso porque a classe média é o extrato populacional mais sensível à pesada carga tributária e à má qualidade dos serviços públicos. Seu poder é o grito. Nas urnas.
A eleição deste ano acontece sob a influência dessa mudança no perfil socioeconômico do país. O peso específico dos recém-chegados à classe média, cujo padrão de vida melhorou, já é perceptível nas pesquisas de intenção de voto: os eleitores em ascensão na escala de mobilidade social tendem a dar seu voto a candidatos com propostas mais conservadoras - ou menos transformadoras. Os ditos radicais, como são percebidos os candidatos do PSOL, PSTU e PCO, por exemplo, não conseguem espaço real nesse eleitorado. No máximo, obtêm simpatia.
A “nova classe média” é pragmática, apolítica (no sentido da participação equidistante do jogo político) e resistente a “leituras” engajadas, de viés ideológico, da cena brasileira. A maioria não participa sequer de movimentos organizados. Não costuma se preocupar com o passado (em temas como o período da ditadura, por exemplo), mas quer saber do futuro (em temas sociais e econômicos). Quer mesmo é saber qual candidato vai garantir a manutenção da sua mobilidade social, ou seja, as condições favoráveis à expansão de seu poder de consumo. Quer saber do acesso ao crédito, à moradia e à escola, inclusive à universidade. E quer dos candidatos a apresentação de garantias, não apenas promessas.
Trata-se de um conjunto de eleitores pragmáticos, racionais, distanciados da política cotidiana, e, sobretudo, exigentes, com sede de desenvolvimento individual. São consumistas, sim, ansiosos por produtos aos quais antes, na classe D, não tinham acesso. Seu temor é a perda do emprego, trabalho e da renda crescente - a via de acesso ao elevador social. E isso é relevante. Trata-se da motivação básica com a qual metade do eleitorado - concentrada nessa nova classe - vai às urnas.
É bom manter olhos presos nesse jovem eleitor dessa nova classe média, porque fará a diferença nas próximas eleições. Ele é um ator da globalização, via internet. Se os das classes A e B têm computador em casa, os da C frequentam lan houses. E este quer chegar onde o outro já está, a começar pelos símbolos, como as roupas de grife.
Os jovens da classe C (15 a 24 anos de idade) representam 19,8% da população nessa faixa de idade - somam 18 milhões, ou 8% dos cidadãos com direito a voto. Têm papel essencial na mudança do comportamento do eleitorado. Hoje, 48% dos jovens - em algumas regiões até mais - decidem os hábitos de consumo dentro de casa. Influenciam a família porque têm mais acesso à informação. O nível de escolaridade da classe C ainda oscila entre baixo e médio, mas seus filhos - que somam 19,8% da classe - já podem ir à universidade. Significa que estarão no centro da influência ou da referência familiar nas eleições desta década.
É daí que virá o impulso de mudança na política. Com acesso à informação e melhor nível de escolaridade que seus pais, esse jovem já é um consumidor exigente e deve se tornar um eleitor cada vez mais exigente.
Os políticos ainda não conseguiram alcançá-lo. Mas é certo que propostas do tipo troca de voto por dentadura ou uma “boquinha” não vai conseguir seduzi-los. Há indícios de fim do voto clientelista no horizonte. Ao menos da forma como conhecemos nos últimos 50 anos. Se duvidam, ponham na conta do meu otimismo, e aguardem.
VIVIANE MEDEIROS CHAIA é socióloga.
As informações são do jornal O Globo de 05/09/2010.
A nova classe média brasileira é composta por 52% da população economicamente ativa. São 92,8 milhões de pessoas, que compõem o contingente de trabalhadores com salário mensal variável entre R$ 1.115 e R$ 4.807. Ali se concentram 46% da renda nacional.
Esses 30 milhões de cidadãos recém-chegados à classe média (um terço do total) passaram a ter um novo padrão de vida, mensurável pelo acesso a novos produtos, serviços e bens imobiliários. Eles se instalaram no meio da pirâmide social em consequência da política de estabilização econômica (Plano Real) e da ampliação de políticas de inclusão social no governo Lula.
Uma alteração dessa grandeza no perfil socioeconômico do país implica, numa reavaliação do comportamento político da sociedade. Isso porque a classe média é o extrato populacional mais sensível à pesada carga tributária e à má qualidade dos serviços públicos. Seu poder é o grito. Nas urnas.
A eleição deste ano acontece sob a influência dessa mudança no perfil socioeconômico do país. O peso específico dos recém-chegados à classe média, cujo padrão de vida melhorou, já é perceptível nas pesquisas de intenção de voto: os eleitores em ascensão na escala de mobilidade social tendem a dar seu voto a candidatos com propostas mais conservadoras - ou menos transformadoras. Os ditos radicais, como são percebidos os candidatos do PSOL, PSTU e PCO, por exemplo, não conseguem espaço real nesse eleitorado. No máximo, obtêm simpatia.
A “nova classe média” é pragmática, apolítica (no sentido da participação equidistante do jogo político) e resistente a “leituras” engajadas, de viés ideológico, da cena brasileira. A maioria não participa sequer de movimentos organizados. Não costuma se preocupar com o passado (em temas como o período da ditadura, por exemplo), mas quer saber do futuro (em temas sociais e econômicos). Quer mesmo é saber qual candidato vai garantir a manutenção da sua mobilidade social, ou seja, as condições favoráveis à expansão de seu poder de consumo. Quer saber do acesso ao crédito, à moradia e à escola, inclusive à universidade. E quer dos candidatos a apresentação de garantias, não apenas promessas.
Trata-se de um conjunto de eleitores pragmáticos, racionais, distanciados da política cotidiana, e, sobretudo, exigentes, com sede de desenvolvimento individual. São consumistas, sim, ansiosos por produtos aos quais antes, na classe D, não tinham acesso. Seu temor é a perda do emprego, trabalho e da renda crescente - a via de acesso ao elevador social. E isso é relevante. Trata-se da motivação básica com a qual metade do eleitorado - concentrada nessa nova classe - vai às urnas.
É bom manter olhos presos nesse jovem eleitor dessa nova classe média, porque fará a diferença nas próximas eleições. Ele é um ator da globalização, via internet. Se os das classes A e B têm computador em casa, os da C frequentam lan houses. E este quer chegar onde o outro já está, a começar pelos símbolos, como as roupas de grife.
Os jovens da classe C (15 a 24 anos de idade) representam 19,8% da população nessa faixa de idade - somam 18 milhões, ou 8% dos cidadãos com direito a voto. Têm papel essencial na mudança do comportamento do eleitorado. Hoje, 48% dos jovens - em algumas regiões até mais - decidem os hábitos de consumo dentro de casa. Influenciam a família porque têm mais acesso à informação. O nível de escolaridade da classe C ainda oscila entre baixo e médio, mas seus filhos - que somam 19,8% da classe - já podem ir à universidade. Significa que estarão no centro da influência ou da referência familiar nas eleições desta década.
É daí que virá o impulso de mudança na política. Com acesso à informação e melhor nível de escolaridade que seus pais, esse jovem já é um consumidor exigente e deve se tornar um eleitor cada vez mais exigente.
Os políticos ainda não conseguiram alcançá-lo. Mas é certo que propostas do tipo troca de voto por dentadura ou uma “boquinha” não vai conseguir seduzi-los. Há indícios de fim do voto clientelista no horizonte. Ao menos da forma como conhecemos nos últimos 50 anos. Se duvidam, ponham na conta do meu otimismo, e aguardem.
VIVIANE MEDEIROS CHAIA é socióloga.
As informações são do jornal O Globo de 05/09/2010.
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